PERFORMATIVIDADE NARRATIVA por Cristiane Paoli Quito

 

 

 

 

 

 

 

 

foto Otávio Dantas

Passei momentos a me perguntar: “o que seria, afinal, ‘Performativi-
dade Narrativa‘, e por que eu?!”. Fui à pesquisa! Externa e interna, em
mim… Será que, nesse início de século 21, o que faço é denominado
“performatividade narrativa”? Porque nenhuma borda me cabe… Em
princípio, o termo já guarda em si uma explosão de “cores”. Como se
“explodíssemos” um quadro renascentista e sua “narratividade pictóri-
ca”. Daí a “explosão de cores”. Em meio a tantas rupturas e reconstru-
ções, vivemos instantes de contradições.

Teatro pós-moderno e teatro pós-dramático, aqui, ganham o nome de
“performatividade”. Talvez por incluir a arte no cotidiano: a não-repre-
sentação, mas o ser, o fazer, o revelar, trazer o “acontecimento” para
o real. As sensações e os sentidos mais fortes que o significado. A inte-
ração e interfaces das outras artes. O Fim da causa e conseqüência. O
efêmero. A criação, o processo, e o resultado em carne viva; performer
e espectador em risco.

Narrativa… narrativa?! Narrativa é a história em si! Mas isso não foi
quebrado no teatro pós-moderno/pós-dramático? A estrutura clássica
da narrativa sim, com relação a personagem, hierarquia dos fatos, mes-
mo espaço e tempo. Hoje, a narrativa não se obriga a uma linearidade,
muito menos uma relação de tempo e espaço: ela se abre para um jogo
de “desconstrução” para que múltiplas leituras possam ser feitas. O
que seria um “ponto de vista” é, hoje, a aceitação das diferenças. As
maneiras de ver são infinitas. A narrativa pode se abrir a infinitos pris-
mas. A arte se abre, permitindo ecoar novas percepções.

Você pode não ter mais personagem, ou tempo linear, mas fato você
tem: sua presença já é um “fato”. Será que daí não se parte uma nar-
rativa? Ou a narrativa estaria no tema, no fato? De repente, o retorno
à uma estrutura clássica: uma contradição, uma incongruência. Posso
ter a estrutura, mas em ruptura. Vivemos em um mundo contraditório,
incongruente. Dessa natureza do “conflito”, ou do teatro, é que nasce a
cena. Ou do atrito que nascem as coisas.

Seria o “retorno à narrativa” uma “necessidade de comunicação”?
Talvez pelo encantamento da “borda entre ficção e real”. Muitas ve-
zes, a narrativa trata da ficção. Na maioria das vezes, a crueza e o
desinteressante do cotidiano não nos apresentam o “lúdico para o vôo”.
Então, depois de termos nos despido de “personagens”, das relações de
conflitos evidentes, dos gabinetes, e ido para o “nada”, para o espaço
vazio (das relações, dos “sem tempo”), realizamos um renascimento do
enlevo, da condução entre “falso e verdadeiro”, ou “mentira e verdade”,
ou ainda “lúdico e realidade”. Encontramos espaço de liberdade sem o
aprisionamento das personagens rígidas e suas histórias; para os de-
poimentos “inverídicos/verossímeis”; ou depoimentos “verdade/ilusão”
dos intérpretes.1 Performers que trazem, carregam toda a sua história
pessoal para se apropriarem de outros temas da vida.

Minha prática tem sido encontrar, na história desses intérpretes, movi-
mento poético que se reorganiza a partir de uma relação temática e
estruturas técnicas. O que vem de fora – tema e técnicas – e o que vem
de dentro – história de vida – entram em simbiose para a comunicação.

O que importa aqui é a necessidade de expressão, que não se limita mais
a se encaixar nos modelos ou “denominações de segmentos de lingua-
gens”, e sim conduzir/convidar o espectador a participar desse ritual
das interfaces das artes. Que ele não seja apenas uma interrogação
permanente e intocada, mas “comunicado”, cúmplice da criação.

Descubro agora que o que faço pode ser “performatividade narrativa”.
Na Cia. Nova Dança 4, e em outros trabalhos conduzidos sob minha
direção, a relação da improvisação temática é o eixo de realização. É o
que acredito ser o que aqui se denomina “performatividade narrativa”.
Será?

2009 – Cristiane Paoli Quito

texto publicado em VERBO 2010, do conjunto de textos do Verbo Conjugado 2009 / Galeria Vermelho e Centro Cultural São Paulo

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